Bambam e Popó. O Brasil inteiro está falando sobre isso. Onde quer que você ligue, está se falando sobre essa luta, uma luta que eu particularmente acompanhei desde o momento em que o Popó e o Bambam marcaram, acho que mais ou menos um ano, quando o Naldo desistiu. O Bambam vinha da luta com Whindersson. Mas, antes de entrar no que eu quero falar sobre essa luta, é importante fazer aqui um disclaimer sobre mim e esportes. Para quem já me conhece há mais tempo, sabe que eu não tenho absolutamente nenhuma afinidade com esportes, o que me faz lembrar do meu pai. Meu pai era italiano, palmeirense, muito aficionado pelo Palmeiras e pelo esporte. O sonho do meu pai era que eu jogasse bola. Então, ele tentou de todas as formas. Para você ter uma ideia, meu pai me inscreveu na escola de futebol do Rivelino, um dos maiores ídolos que já jogaram no Brasil e que é do Corinthians. Para um palmeirense colocar o filho para jogar na escola do maior ídolo do Corinthians daquela época, você imagina o quanto meu pai queria que eu aprendesse a jogar bola.
Eu me lembro do dia em que o Rivelino, que é um amor, eu já vi chutar uma bola ao vivo, e realmente é algo fora de série. Eu me lembro de uma conversa que tive, ele tentava também de tudo para que eu pudesse jogar. Ele falou: “Seu Giro, não faz isso com o Júnior, ele não é pra isso, não nasceu pra isso”. E com o maior carinho do mundo, meu pai acabou me colocando depois numa escola de informática, algo que eu realmente tinha vontade de fazer. Então, quer dizer, o meu comentário sobre essa luta absolutamente não vai ser um comentário esportivo, porque eu tenho tanto conhecimento de esporte quanto sobre a reprodução dos golfinhos no Ártico. Nenhum, né? Qualquer coisa que eu comente do ponto de vista esportivo vai ser algo sem nenhum embasamento. Então, eu gostaria de fazer um comentário sobre essa luta do ponto de vista da disciplina, da área de conhecimento que realmente eu tenho como contribuir, que é do ponto de vista da gestão da mudança e do comportamento organizacional.
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Essa história começa ali, quando vem da luta do Popó com Whindersson Nunes. Popó já estava há bastante tempo aposentado, já estava fora um pouco da mídia. O Whindersson também estava num momento bastante complicado da vida dele, tinha se afastado um pouco, e aí eles marcam essa luta, o que atrai demais as atenções. Isso vem de uma cópia ali, mais ou menos, de um padrão que os Estados Unidos estão lançando, de eventos que misturam entretenimento com esporte, música e luta, comédia e luta, pessoas que não são do meio da luta desafiando lutadores, enfim. E o Brasil, como sempre, muitas vezes faz, pega esses eventos de sucesso lá de fora e tenta trazer para cá, e ver o que acontece. E deu super certo. A quantidade de inscritos no Instagram do Popó, nas redes, aumentou exponencialmente. Ele ganhou dinheiro, o Whindersson também, e já apareceu uma nova luta, que foi do Naldo, que também estava meio no esquecimento nessa questão de desafiar, também voltou à tona, mas ele acabou desistindo antes da luta. E o Bambam entrou nessa história. E eles estão há mais ou menos um ano nessa briga aí, em redes sociais, em canais de televisão, em podcast, um desafiando o outro, provocando o Popó. O Popó é tetra campeão mundial do peso dele, em várias categorias, acho que em 3 categorias diferentes. Ontem aconteceu a luta e foi a última luta do evento, príncipe no card principal, a principal atração que levou 36 segundos até que o Popó nocauteasse o Bambam. 36 segundos e o juiz interrompeu a luta antes que a desgraça fosse maior pro lado do Bambam.
E hoje, claro, todo mundo comentando sobre isso e eu acompanhando os comentários, gosto de ver o efeito que esse tipo de situação traz, observando o comportamento humano, que é uma coisa que eu gosto muito de estudar. E me deparo com uma mensagem do professor Leandro Karnal, que é um cara que eu acompanho, gosto demais. Tive a oportunidade de ser mestre de cerimônias em um evento em que ele palestrou, a gente interagiu durante algum tempo, foi muito legal, e eu vi o professor comentando, colocando uma mensagem ali, um desenho né, do Bambam, aquele dos Flintstones, filho, se eu não me engano, do Barney, é uma imagem, um desenhozinho, mas fazendo referência, claro, ao Bambam, que ontem tomou esse nocaute. E o professor comentou sobre o efeito Dunning-Kruger. Deixa eu comentar um pouquinho sobre o que é esse efeito. O efeito Dunning-Kruger é um fenômeno psicológico, um viés cognitivo, que acontece quando pessoas que têm pouquíssima habilidade, pouquíssimo conhecimento sobre algo, acham que conhecem demais sobre aquilo. Um amigo meu muito querido, chamado Tiago Nascimento, falava sobre a fronteira do conhecimento: que quanto mais a gente sabe, mais a gente acha que não sabe. E quanto menos uma pessoa sabe, mais ela acha que tem certeza sobre as coisas.
Quanto menos conhecimento alguém tem sobre algo, mais certezas absolutas a pessoa tem sobre aquela questão.
E esse efeito leva a autoavaliações inflacionárias. Vou colocar esse artigo para vocês poderem baixar ali no meu site, ou então nos posts que eu vou compartilhar essa reflexão aqui. Essa pesquisa demonstrou então que pessoas que têm pouquíssimo desempenho em tarefas específicas tendem a superestimar suas habilidades e acreditam piamente que estão no mesmo nível, ou até melhores, do que aqueles que são altamente competentes naquela mesma questão. Isso ocorre, segundo o estudo, porque a falta de conhecimento e habilidade impede que eles reconheçam a sua própria limitação, a sua própria incompetência. E curiosamente, esse mesmo efeito também descreve como pessoas altamente competentes tendem a subestimar a sua competência. Paradoxo socrático, não é? “Tudo que sei é que nada sei”, embora essa frase nunca tenha sido dita, pelo menos não há confirmação de que ela tenha sido dita por Sócrates.
E por que isso me chamou tanto atenção? Porque eu já fui vítima desse viés cognitivo, desse desvio de razão, desse fenômeno psicológico que é o efeito
Dunning-Kruger. Quando eu tive uma padaria, muitos de vocês conhecem a história, e eu quebrei miseravelmente. Essa padaria teve um impacto na minha vida financeira de 10 anos de dívida, mais de 1 milhão de reais de prejuízo ao todo. E eu quebrei porque, com a quantidade de cursos de gestão empresarial que eu tinha feito, zero; quantidade de livros que eu tinha lido sobre isso, dois; experiência que eu tinha em negócios, absolutamente nada. E eu comecei a tomar uma série de decisões. Pessoas mais experientes falavam: “Cara, você está indo no caminho errado, vai dar errado, vai quebrar, você está fazendo errado”. E eu tive uma das piores coisas que pode acontecer com uma pessoa nesse momento, que é ter sorte. Eu, mesmo recebendo todos os conselhos, mesmo não tendo nenhuma competência, comecei a dar certo. E eu comecei a vender e a padaria começou a crescer. E em menos de 2 anos, a gente passou de 2 empregados para 48, em um estabelecimento de 2 andares que trabalhava 24 por 7, vendia. Chegamos a vender até meio milhão de pães em 1 mês. E finalmente quebramos, né? E quebramos miseravelmente. E olhando hoje para trás e conectando os pontos, fica muito evidente que o que me fez quebrar foi uma profunda incompetência para fazer aquilo somada à sorte de ter dado certo num primeiro momento. Porque se eu tivesse tomado um nocaute logo no primeiro mês, eu teria talvez tido mais oportunidade de perceber o tamanho da minha incompetência. E, portanto, desistido daquele negócio, daquela forma que eu estava fazendo, pelo menos até que eu tivesse mais condições de andar para frente, né? Foi o Empretec que me deu, inclusive, essa visão.
E eu fico me perguntando, então, a grande reflexão que eu trago é: o que teria acontecido se o Bambam tivesse tido a mesma “sorte” que eu tive? E se o Bambam tivesse ganhado? Qual teria sido a mensagem no perfil do professor Leandro Karnal? Estou usando o professor Leandro Karnal como um exemplo, porque foi onde eu vi a mensagem. Mas qual teria sido a mensagem no perfil dele? E, mais do que isso, qual teria sido a consequência dessa vitória para as decisões do Bambam no futuro? E qual teria sido a mensagem maior, não a do professor Leandro, mas a mensagem maior? Qual seria a mensagem que nós absorveríamos a partir dessa vitória? Qual seria o risco, por exemplo, de interpretarmos essa mensagem de um cara que nunca tinha lutado, zero lutas, que era o Bambam, contra o tetracampeão mundial de boxe, o Popó, saindo do papá Freitas, como se eu não me engano, 35 ontem, 36 nocautes na sua história, de 40 lutas, que defendeu o título mundial por 10 vezes seguidas, contra um cara que nunca havia lutado, 30 anos de boxe de um lado, zero lutas do outro? O que teria acontecido se o Bambam tivesse vencido essa luta? Qual teria sido a grande mensagem? E o que me faz temer é que nós poderíamos coletivamente incidir em outro viés cognitivo chamado heurística da representatividade, que, por sinal, foi um dos vieses que também me acometeu no momento da padaria, que é você pegar um caso isolado e utilizar esse caso como exemplo para justificar uma decisão no futuro. Por exemplo, a pessoa fala: “Ah, não,
o Mark Zuckerberg, ele não fez faculdade, então eu não preciso fazer faculdade. Se ele, que é o dono do Facebook e ganhou bilhões de dólares e é um dos caras mais influentes do planeta, não fez faculdade, logo, então, faculdade não serve pra nada, eu não preciso fazer faculdade também”. Isso é o tal do viés da heurística da representatividade, que nós julgamos a probabilidade de um evento ocorrer com base no quão similar esse evento é de um cenário conhecido. Assim, se o evento parece muito com um tipo de situação típica, nós assumimos que é provável que aconteça de novo. Será que uma vitória do Bambam poderia de repente colocar a gente nesse tipo de viés, que as pessoas passassem a olhar alguém que não tem experiência alguma em algo e achar que você não precisa de experiência, que você não precisa de treino? E treino que eu digo, não é o treino para a luta, é treino na vida, né? Que as horas de voo, de fato, no final das contas, não fazem diferença; que uma pessoa que te desafia pelo fato de ser um pouco mais forte do que você, ou muito mais forte do que você, é suficiente para te detonar, para acabar com a tua história em uma noite, né? Qual teria sido a mensagem de fato? Eu não sei. De fato, eu não sei. Eu imagino que não teríamos visto essa mensagem do professor Leandro se o Bambam tivesse ganhado a luta, mas eu fico me perguntando porque, embora a maior parte das vezes a lógica nesse caso prevaleça, é óbvio que a experiência, o conhecimento, a preparação, a dedicação, a história, a vida de uma pessoa em uma atividade fazem toda a diferença para o resultado final. Mas algumas vezes não vai ser assim. E o que nós vamos fazer com essa informação? O quanto nós podemos estar tomando decisões nas nossas empresas por conta de eventos isolados que funcionaram na Disney, na Spotify, ou em outros lugares? “Ah, então, se funcionou lá, vai funcionar aqui também”. Mas espera um pouquinho, a gente está olhando o cenário completo ou a gente está mais uma vez recaindo na heurística da representatividade? E se essa heurística estiver sendo somada ao efeito Dunning-Kruger, ou seja, pouquíssima competência naquilo para decidir, e ainda por cima estamos usando um evento aleatório para justificar o comportamento do todo? O quanto isso pode estar associado aos fracassos que a gente está muitas vezes sendo submetido? Está aí uma reflexão para a gente pensar. Espero que traga alguns insights para você e até a próxima.
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